Sobre a arte de falar e não dizer nada

Sobre o tema explicitado no título, é de grande importância nos dias atuais saber expressar-se de forma coesa e unívoca, para que eventuais disgressões não atrapalhem o entendimento do leitor/receptor da informação transmitida. O assunto em questão já obteve muitos estudos complexos, os quais norteiam um melhor entendimento da forma de palestrar, facilitando assim o processo de aprendizado. Por outro lado, a análise de diversos resultados alimenta a percepção da urgência de saber agir na arte de transmitir conhecimento.

Complicado. Um parágrafo inteiro perdido, que poderia ser resumido em uma só frase, ou melhor, nem ter sido feito. Agora é valendo: esse artigo tem a intenção alertar a todos sobre o perigo  de ser prolixo. Ficar divagando, dando voltas em argumentos sem base ao invés de ser direto, simples e coeso por vezes desqualifica o emissor da mensagem. Isso quando o receptor está prestando atenção em algo. Na maioria das vezes, o texto/palestra enfadonha torna o leitor/expectador passivo, lendo/ouvindo sem ver/escutar. E, por incrível que pareça, os maiores produtores de conteúdo nesta arte milenar são os nossos grandes amigos coaches.

Nos próximos tópicos, darei um passo-a-passo de como ser um mestre na arte de provocar o “modo avião” nos receptores das informações, e também um tutorial de como atuar no coaching. Muita atenção aos tópicos abaixo:

Se contradiga: diga palavras com sentidos opostos ou incompatíveis e, de forma enigmática, combine-as numa óbvia contradição. Exemplos: “A sanidade é apenas mais uma forma de loucura”. “A vida é frequentemente uma forma de morte”. “O ordinário é extraordinário”. Essas sentenças são absolutamente impenetráveis e podem facilmente parecer profundas. Se você é um aspirante a coach da verdade, por que não produzir seus próprios comentários contraditórios? Eles fazem com que a audiência faça o trabalho por você. O significado não é algo que você dirá. Seus seguidores é que terão a tarefa de decifrar. Apenas sente-se, adote uma postura sábia e deixe-os fazer o trabalho mental.

 Vantagens das contradições: uma série de afirmações simples e não ambíguas é fácil de refutar, ao passo que não é tão fácil fazer o mesmo com tais afirmações enigmáticas. Assim, se você pensa em iniciar sua própria religião e quer dizer coisas que parecerão profundas e também invulneráveis à crítica, tente fazer afirmações contraditórias. Afirme, mas então negue. Por exemplo, diga que seu deus é – e, no entanto, não é. Que seu deus é tudo e nada. Que ele é um, mas ao mesmo tempo vários.

Use jargões: Se você é um coach do empreendorismo, coach instrutor, consultor de estilo de vida, introduzir algum jargão pode incrementar ainda mais a ilusão de profundidade. Aqui vai um truque comum: invente algumas palavras que parecem ter significado similar ao de certos termos bem conhecidos, mas que deles difiram de uma maneira nunca completamente explicada. Por exemplo, não fale sobre as pessoas serem felizes ou tristes; fale sobre elas terem predisposições positivas ou negativas.

O próximo passo é traduzir algumas crenças para seu novo vocabulário. Pegue a observação banal de que pessoas felizes tendem a fazer as outras pessoas mais felizes. Ela pode ser remodelada como “predisposições positivas têm alto poder de transferência”. É também útil adotar o vocabulário de “forças”, “energias”, “equilíbrios” e “vibrações”. O uso dessas palavras irá sugerir que você descobriu algum poder profundo que pode ser aproveitado e usado pelas outras pessoas. Isso fará com que seja bem mais fácil persuadi-las de que elas podem perder algo de realmente importante caso não compareçam a um de suas palestras. Assim, se você é um coach empreendedor, tente fazer seminários sobre o “Aproveitamento das Predisposições Positivas dentro do Varejo”. E se algum espertinho for corajoso o suficiente para levantar a mão e perguntar o que exatamente é uma “predisposição positiva”, defina utilizando mais jargão. Fazendo isso, você jamais terá de realmente explicar o significado da sua conversa fiada.

Além disso, as várias crenças embutidas no seu jargão irão gerar a ilusão de que você realmente tem algo a dizer, mesmo que audiência não faça muita ideia do que seja – o que é uma boa forma de deixá-la com mais vontade de ouvi-lo. Adicionar algum jargão ou referência científica pode ser particularmente útil ao seu papo furado porque essas coisas emulam autoridade e substância. Referências à mecânica quântica são particularmente populares entre os vendedores de conversa fiada pseudocientífica. Uma vez que se espera que ela faça afirmações um tanto estranhas e difíceis de entender, é uma boa ideia abusar das referências em favor das bizarrices que você tem a dizer. As pessoas pensarão que você deve ser muito inteligente e sequer perceberão que você é um tapeador. Se você for ambicioso, pode ser uma boa ideia inventar uma palestra com o título “Predisposições Positivas e Mecânica Quântica”. Se tiver alguma dúvida em como iniciar o trabalho, deixo uma tabela com milhares de combinações de mensagens impactantes, porém sem significado.

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Espero que esse breve artigo possa ajudá-lo a detectar com mais eficácia os mestres na arte de falar e dizer nada (pseudoprodundidade). Mas e se você estiver no papel de receptor de tais tolices, como responder? Qual a melhor forma de revelar a pseudoprofundidade pelo que ela é? O maior inimigo da pseudoprofundidade é a clareza. Um dos modos mais eficazes de desarmá-la é traduzi-la em português corrente. Diga “certo, você está dizendo que…” e anote em prosa clara e sem ambiguidades o que realmente se quer dizer. Esse exercício de tradução revelará que o que foi dito pode ser uma das seguintes três coisas: (1) uma falsidade óbvia, (2) maluquice, ou (3) uma crença. Mas combater a pseudoprofundidade raramente é assim tão fácil. Aqueles que a despejam sobre os outros muitas vezes estão até certo ponto cientes que é provável que a clareza os desmascare e, assim, provavelmente resistirão às suas tentativas de reformular o que eles pretendem dizer em termos claros e não ambíguos. É quase certo que eles irão acusá-lo de estar entendendo as coisas de forma rude. Obviamente, eles não irão explicar claramente o que querem dizer: somente enrolarão você mudando de assunto, levantando cortinas de fumaça, acusando-o de não entender outras coisas mais, e assim por diante. Por essa razão, desmascarar a pseudoprofundidade muitas vezes requer tempo e paciência.

Sarcasmo e sátira podem ter um papel a desempenhar. O riso pode quebrar o feitiço que a pseudoprofundidade lança sobre nós. Uma pequena sátira pode ajudar-nos a reconhecer que fomos enganados por alguém que diz pouco mais do que crenças, falsidades ou maluquices travestidas de pensamento profundo. Eis aí a razão pela qual os mestres da pseudoprofundidade com frequência se opõem à sátira e ao escárnio, ficando ofendidos com tais coisas. No entanto, há um cuidado importante que devemos ter quanto ao uso do humor. Obviamente, qualquer crença pode ser ridicularizada. Não estou sugerindo que a piada deve substituir a crítica clara e rigorosa do tipo que eu procurei oferecer aqui. Ninguém deve ser incentivado a abandonar uma crença só porque as pessoas riem dela. Mas por causa da habilidade de ajudar a quebrar o feitiço que a pseudoprofundidade lança sobre suas vítimas, permitindo que vejamos por um momento ou outro que fomos crédulos ou tolos, um pouco de escárnio pode muito bem ser parte de uma resposta. Uma boa piada pode ser útil e legítima, se for merecida.

Considerações Finais

É preciso muita cautela no uso dessa poderosa ferramenta que pode te transformar num ídolo ou num ser humano indesejável em qualquer ambiente. A informação há de ser passada de forma coesa resumida, facilitando o entendimento do receptor. Muita atenção aos senhores da verdade, nossos amigos coaches. Em sua maioria, são mestres em gerar lero lero, com obviedades e vocabulários rebuscados. Dessa forma, seja mais assertivo nos argumentos, seja direto e evite disgressões. Quando falar, FALE!

Abraços do pracinha =)

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